sábado, 14 de janeiro de 2012


CAPÍTULO 12





       
          Como já havia me decidido a encerrar minhas atividades como garoto de programa, saía sempre que possível para procurar um emprego. Mas não era muito fácil, pois estudava de manhã e a tarde treinava voleibol pelo Colégio. Além disso, não havia muitas vagas de emprego sendo oferecidas no período noturno, como garçom ou algo parecido.
Num desses dias, andando pela rua XV de novembro, conhecida também como rua das flores, parei num desses quiosques que existem por toda a rua. Estava com muita fome, e pedi um suco e alguma coisa para comer. Estava um calor insuportável, e eu adorava usar bermuda e camiseta regata. Como era verão, eu estava bem bronzeado. Minha cor, no verão, era algo invejável! Minha pele ficava com um tom dourado, com todos os pelos dos meus braços e pernas clarinhos, como se tivessem sidos descoloridos.
Sentei-me numa mesa próxima ao balcão e fiquei esperando meu pedido. Comecei a viajar em meus pensamentos, rezando para não encontrar nenhum daqueles homens com quem eu já havia saído por dinheiro. Quando o garçom chegou trazendo meu pedido, percebi uma mulher na mesa ao lado, que não tirava os olhos de mim. Ela era uma senhora de aproximadamente uns trinta anos, elegantemente vestida num tailler salmão, saltos altos e muito bem maquiada. De repente, ela veio até minha mesa.
-Posso me sentar?
-Perguntou.
-Tudo bem.
-Respondi.
Ela elegantemente se sentou, colocou sua bolsa na cadeira ao lado, mantendo uma postura invejável.         Está precisando de alguma ajuda?
-Perguntei.
-Acabo de encontrar o que eu procurava. 
-Me disse com um sorriso.
-Me chamo Marina.
Ela nem quis saber o meu nome, e foi logo me pedindo:
-Fique em pé e levante sua camiseta, para eu te ver melhor.
 Achei estranho aquele pedido e fui logo dizendo com um ar sério:
-Não sou nenhum Garoto de Programa!
Novamente ela me deu um sorriso lindo e disse:         
-Deixa de bobeira, guri! Quero apenas ver sua barriga.
Meio constrangido, fiz o que ela me pediu.
Ela me olhou por alguns instantes, depois me deu seu cartão e ainda fez questão de pagar a conta. Então, caminhou elegantemente até chegar ao seu carro, passo a passo, como se fosse uma rainha.   Resolvi olhar o que estava escrito no cartão, e para minha surpresa, ela era proprietária de uma agência de modelos. Comecei a rir, na verdade gargalhar. O garçom ficou olhando para mim, sem entender nada... E eu continuei ali sentado, rindo a toa. Quem me dera ser modelo! Eu era apenas um atleta, que adorava jogar.
Mesmo assim, no outro dia fui até a tal agência. Como estava precisando de dinheiro, veria no que ia dar. Afinal de contas, não teria que sair com nenhum velho assanhado. E lá fui eu, meio sem jeito, com medo e ao mesmo tempo sentindo uma emoção nova: a de ser admirado por alguém que não desejava somente sexo, que me tratava com muito respeito.
Entrei no conjunto comercial cujo endereço estava escrito no cartão. O caminho até a agência era lindo, muito florido, com um canteiro de amor perfeito de diversas cores. O piso imitava as calçadas de Copacabana, com árvores que faziam sombras nos bancos de madeira. Até hoje acho um charme! Existiam várias lojas e a agência ficava no final do corredor, que era bem amplo e ensolarado. Ainda tímido, acabei entrando e logo ao me ver, a Marina disse para a secretária:
-Viu o meu mais novo achado?
Fiquei assustado, mas não poderia ser nada que fosse me prejudicar. A secretária, que não recordo o nome, mencionou que eu apenas precisava de um trato.  Realmente, minhas roupas estavam encardidas, cabelos até os ombros, queimados do sol. Fui me sentar e a Marina já foi logo dizendo:
-Não, não mocinho. Vamos para outro lugar.    Entramos no carro dela, muito condizente com sua elegância: uma Mercedes preta, com bancos todo em couro. Dava até medo de sentar e deixar uma marca! Seguimos pela Rua Vicente Machado até um estúdio fotográfico, que por sinal, era o estúdio mais procurado pelas madames da alta sociedade naquela época. Ele existe até hoje. 
No local, já havia toda uma equipe me aguardando para a transformação. Cortaram meu cabelo, me barbearam, troquei de roupa e literalmente me jogaram na frente das câmeras fotográficas. Assustado, fui fazendo tudo que me pediam, E não é que eu levava o maior jeito?!
Não demorou muito e surgiu o meu primeiro trabalho: de cara ia fotografar para uma revista masculina. Apareci em duas páginas, explicando passo a passo como fazer exercícios físicos. Modestamente, eu tinha um corpo muito bonito. Na minha cidade foi um escândalo! Meu pai achou isso ultrajante, pois como poderia o filho de um prefeito posar para uma revista masculina? E ainda vestindo apenas um short curtíssimo! Ele queria que eu fosse embora de qualquer jeito. Não sabendo mais o que fazer, de tanto ele insistir eu acabei cedendo.
Marina não desistiu de mim. Enviou um curso de modelo para Apucarana, que era uma cidade vizinha a minha. Foi um sucesso, e é claro que fiz o curso de graça, escondido do meu pai. Ele achava que isso não era coisa de homem. Quem disse que eu não era homem? Só que eu era um homem diferente, com uma orientação sexual diferente. Por causa desse curso, comecei a ganhar um bom dinheiro, viajando para todas as partes do Brasil, desfilando com modelos famosas.


CAPÍTULO 13






        Acabei sendo contratado pela Titu´s Jeans, uma fábrica que estava começando a se lançar no mundo da moda. Era coordenada por dois irmãos, pessoas fantásticas, muito simpáticos e atenciosos com os modelos, principalmente comigo. Acabei sendo, de certa forma, o garoto propaganda da marca deles. Aí as coisas começaram a melhorar. Mas também continuei a trabalhar com a Marina. Conseguia manter o trabalho com as duas empresas.
A cada desfile, acabavam mudando os modelos. Mas eu, sempre continuava desfilando para eles. Era um amor recíproco. Além disso, as roupas tinham uma modelagem muito legal, permitindo que as pessoas se sentissem mais sensuais e interessantes. Isso fazia com que eu adorasse ser modelo deles. Foram momentos alegres e que me faziam esquecer problemas familiares. Ali, durante o tempo que estava com a equipe, eu me sentia amado e não sofria qualquer preconceito. Claro que as pessoas não sabiam que eu era gay, acredito que somente a Fernanda e o Robert, os proprietários, sabiam da minha orientação sexual.
O Robert era o cara mais popular que eu já havia conhecido, e também o maior pegador de mulheres. O cara era bom mesmo, pois nenhuma mulher resistia a suas cantadas. Muitas vezes eu ficava observando o seu modo de agir com as mulheres. Ele nem imagina que muita coisa que sei hoje, foi por ficar observando os xavecos dele.
Uma vez, quando estávamos saindo para um desfile, ele me chamou num canto da fábrica. Ofereceu-me uma bebida e sem rodeio algum me perguntou se eu era gay. Fiquei assustado, não sabendo o que responder. Fiquei preocupado em ser demitido por causa disso, mas resolvi falar a verdade. Confirmei e abaixei a cabeça, como se aquilo fosse motivo para me envergonhar...
Ele estava sentado em uma dessas cadeiras de escritório, com uma das pernas esticada e a outra curvada sobre a mesa. Mascava chicletes, e começou um discurso de que ele era heterossexual, que gostava de mulher e todo aquele papo, mas que acaba nos ofendendo sem ter a intenção de ofender. Eu continuava de cabeça baixa ouvindo, o tudo o que ele me falava. Percebendo que eu estava nervoso e sem graça com aquela situação, ele se levantou e foi chegando perto de mim. Com uma das mãos segurou o meu queixo e foi levantando minha cabeça, e olhando em meus olhos falou:
-Não é para você ter vergonha de ser assim. Para mim, o que mais vale é o seu jeito de ser. 
-Então eu ainda posso desfilar pra vocês?
-Perguntei abrindo um sorriso.
Ele riu e me puxou para dar um enorme abraço. Foi a primeira vez que senti que ser gay não era tão monstruoso assim.  Suas palavras me fizeram sentir protegido. O Robert não podia imaginar a felicidade que me deu!
Passou a mão em minha cabeça, me despenteando, e fomos em direção ao carro que estava apenas nos esperando. A Fernanda ficou nos olhando e Robert deu uma piscada para ela. Fiquei em dúvida se ela sabia do teor de nossa conversa, mas não perguntei. Só sei que a partir desse dia eles me tratavam como a um filho. Os outros modelos chegavam a ficar até com ciúmes, mas na realidade, acredito que acabei mesmo sendo o protegido deles.
Passado algum tempo, a Titu´s Jeans parou com os desfiles. Ficamos muito tristes, mas tivemos que aceitar a decisão deles, afinal, nem tínhamos como e muito menos o direito de questionar alguma coisa.
Comecei a passar os finais de semana em Cambira, a minha cidade, coisa que não fazia há muito tempo. Já no primeiro final de semana aconteceu de encontrar uma nova paixão.


















CAPÍTULO 14





       Acabei conhecendo o Marcio, um rapaz que não era considerado um perfil de beleza, mas que me atraiu pelo seu jeito rústico de ser. Foi engraçado como nos conhecemos: eu, minha prima Júlia (que estava passando uns dias em minha casa) e minha irmã Luiza, fomos a um barzinho na minha cidade. Lá, sentamos numa mesa onde podíamos ver o movimento, ou seja, quem entrava e saía do bar. Minha prima estava a fim de conhecer alguém interessante. Meu amigo Eduardo estava cantando no barzinho nesta noite, e ficamos ali por horas. O Eduardo sempre mexia comigo, me fazendo lembrar de um passado nem tão distante assim. Era bom viajar ao passado e sonhar acordado, sonhar com momentos bonitos que tinham acontecido em minha vida.
A certa altura da noite, reparamos que um cara não tirava os olhos de nossa mesa, o que foi nos incomodando. Num dos intervalos, em o som ao vivo dava lugar ao som eletrônico, chamei o Eduardo:
-Quem é aquele rapaz?
-Perguntei apontando com o olhar.
Fazia muito tempo que eu estava fora e não conhecia quase ninguém presente no bar.
-Ele se chama Marcio, e é o cara mais encrenqueiro da cidade. O seu pai é o atual dono dos dois postos de combustíveis da cidade.
-Me respondeu.
-Ele também gosta de arrumar briga o tempo todo! - completou.
         Minha prima ficou assustada e pediu para que fôssemos embora. Eu tinha um jeep bem transado, que comprei com dinheiro que ganhei fazendo programas. Era vermelho, com um enorme Santo Antônio pendurado no retrovisor e sem capota. Eu achava ele o máximo! Quando saía com ele, chamava a atenção de todos por onde eu passava.  
Levei minha irmã e minha prima embora e resolvi voltar, para ver no que daria. Ainda mais que eu queria continuar ouvindo o Eduardo cantar.
Retornando ao barzinho, percebi que o Marcio continuava a me olhar e vi concluí que o negócio era comigo mesmo! Comecei a olhar também, claro que tudo com muita discrição. Já era madrugada, e a música ao vivo tinha encerrado, então paguei a conta e fui embora. Como tinha bebido mais que devia, fui dirigindo devagar.  Quase chegando em casa, vi um carro dando sinal de luz atrás de mim, pedindo para eu parar. Reduzi mais a velocidade do meu carro e ele passou por mim, parando logo à frente. Era um carro popular.  Quando parei meu carro logo atrás, o motorista abriu a porta, e vi que era o Marcio que descia e caminhava em minha direção. Pensei na hora que teria que brigar, já que segundo o Eduardo ele era o maior encrenqueiro da cidade. Dava para perceber que estava um pouco alto, na verdade, totalmente embriagado. Chegou bem perto de mim e foi se apresentando:
-E aí? Sou o Marcio.
 Parecia que se ele não falasse rápido, nunca mais teria coragem.
-Já sei quem é você e também onde trabalha. E sei também que gosta de uma boa briga.
-Eu disse, soltando uma gargalhada.
-Não cara, não vim brigar não!
-Ele foi logo se explicando.
-Na verdade, nem sei direito o que estou fazendo aqui, mas alguma coisa me chamou a atenção. Como eu estava sozinho há algum tempo e realmente era mais atirado, fui logo dizendo:
-Você quer entrar aqui no meu carro?
-Prefiro que você deixe o seu carro em casa e que você venha comigo, no meu carro.
-Respondeu.       
-Você sabe quem eu sou e onde eu moro?
-Perguntei.
-Sim, você é o filho do Prefeito, trabalha como modelo. Sabia que seu nome é lindo?
-Responde o Marcio.
Novamente, dei uma gargalhada daquelas, pois tive a certeza que ele estava mesmo querendo algo a mais comigo. Topei sua proposta e deixei meu carro em casa, e depois entrei no carro dele e fomos a um lugar bem interessante, nos limites da cidade. De lá, víamos ao longe as luzes de várias cidades que compõem o Vale do Ivaí.
Fiquei um tempo observando a natureza, pois havia esquecido como tudo aquilo era maravilhoso: o cheiro do mato, o barulho da água do riacho e para completar o “clima romântico”, o céu estava lindíssimo aquela noite. Havia muitas estrelas e a lua cheia brilhava, parecendo até que se eu esticasse os braços, poderia tocá-la.
-Você vai ficar aí parado olhando pro nada?
-Perguntou o Marcio com impaciência.
 Não consegui me controlar e acabei dando uma enorme gargalhada.
         -Ta me tirando?
          -Questionou ele já meio nervoso.
         Fiquei excitado em transar com um bad boy. Eu iria fazer com que ele ficasse totalmente em minhas mãos e faria dele o que eu quisesse. Puxei-o pelo braço, trouxe bem perto de mim e fui falando baixinho:
         -Você não reparou o local onde me trouxe? Olha a beleza de tudo isso! Esse lugar é perfeito para que um casal se apaixone.
         Imediatamente ele me deu um beijo. Foi a primeira vez que alguém me roubou um beijo. E que beijo gostoso! Senti o gosto da cerveja em sua boca, mas isso não me incomodou. Suas mãos começaram a percorrer o meu peito até chegar ao meu órgão genital, me deixando cada vez mais excitado. Aliás, percebia a sua excitação também, com seu membro latejando em mim. Não sabia como dizer que eu não era passivo, com medo que ele ficasse bravo. Pensei em aproveitar a situação ao máximo.
         De repente, ele se deitou no capô do carro, de costas para mim. Suspirei surpreso e feliz porque aquilo continuaria. Ele queria que eu o penetrasse, e é claro que não me fiz de rogado. No início era apenas sexo casual, que aos poucos foi se transformando em algo mágico. Não sei explicar se foi paixão à primeira vista (ou primeiro encontro), mas era mais do que uma simples “trepada”. Ficamos ali até amanhecer o dia, o que fez com que o local se tornasse ainda mais lindo.  Ficamos os dois parados, ouvindo o som dos pássaros cantando nas árvores, contrapondo com o som da água batendo nas pedras de seu leito. O campo de trigo estava com um tom dourado, e suas espigas balançavam suavemente ao vento, que ajudava a refrescar aquela manhã. Aquele cenário me deu uma vontade enorme de tomar banho no rio. Nosso quanto tempo eu não fazia isso!
-Vamos tomar um banho de rio juntos?
-Disse eu, convidando o Marcio.
-Não posso. - respondeu ele. - Preciso ir para casa descansar, pois é domingo e ainda vou jogar futebol. Faço parte do time da cidade.
-Estamos muito longe da minha casa?
-Perguntei.
-Não. 
-Respondeu.
-Então, apenas me mostre o caminho a tomar que vou ficar aqui, tomando um delicioso banho de rio. Depois vou andando para casa. - disse a ele.
O Marcio entrou no carro e foi embora, enquanto eu descia até as margens do rio. Tirei toda a roupa e dei um belo mergulho naquela água límpida e deliciosamente refrescante. Nadei até a outra margem e deitei numa pedra. Fiquei ali por algum tempo, quando de repente, ouço um barulho na água. Olhei atentamente, procurando o que deveria ter feito aquele barulho. Vi então, alguém vindo em minha direção por baixo d'água, mas não dava pra distinguir quem era. Como a água era muito limpa, conseguia-se perceber que era uma pessoa. Quando se levanta da água, vejo que era o Marcio, que foi logo dizendo:
-Pensei bem e decidi voltar, pois nada melhor do que tomar um banho de rio.
Outra gargalhada, mas desta vez foi bem alta. Na verdade, adorei a volta dele. Ficamos brincando, totalmente nus, e novamente fizemos amor, ali mesmo, dentro d'água.
Saímos do rio e resolvemos descansar um pouco sobre uma enorme pedra, enquanto falávamos de várias coisas, inclusive do que tinha acontecido. Resolvemos manter as aparências perante as pessoas, pois nem ele e nem eu éramos assumidos. Após o calor do sol secar nossos corpos, nos vestimos. Ele me deixou em casa.
Quando eu ia descer do carro, ele me peguntou:
-Você vai me ver jogar, mais tarde?
-Claro! Desde que você marque um gol para mim.
-Respondi com um sorriso.
E não é que ele fez mesmo? Achei o gesto bem bonito e carinhoso. Como eu estava entre alguns amigos dele, ele mostrou o dedo indicador, dizendo em gesto que o gol era pra mim, mas só eu sabia disso. Os amigos gritavam achando que tinha sido para eles. Controlei-me para não rir, e nem poderia ter feito isso. Seria uma afronta às pessoas e elas não entenderiam que um homem tinha feito um gol para outro homem.
Era o começo de uma nova e diferente relação. Como era possível que o cara mais bravo e briguento, fosse uma pessoa doce e romântica. De certa forma, ele me fazia feliz.
Achei que seria divertido juntar a emoção da relação escondida e os flertes perto das pessoas ignorantes que nunca iriam aceitar o relacionamento de dois homens jovens.
Ninguém entendia como eu podia ter uma amizade com uma figura como aquela! Obviamente os amigos dele acabaram sendo meus amigos também, para manter as aparências. Chegamos a namorar duas irmãs, e saíamos todos juntos. No final da noite, acabávamos só nós dois, e era o momento de curtir o nosso mundo, onde só havia lugar para duas pessoas sedentas de amor.
No começo foi tudo muito gostoso, procurávamos encontrar lugares interessantes para nossos encontros. Algumas vezes tudo acontecia dentro do carro mesmo, mas uma vez fomos a um motel. Foi bem difícil convencer o Marcio a ir, mas ele acabou topando. O mais engraçado foi ele se escondendo para que a recepcionista não percebesse que eram dois homens.
Para continuar mantendo as aparências e não surgirem comentários, acabei indo mais longe. Larguei o time de voleibol e comecei a treinar futebol, até que consegui chegar ao time principal, onde ele jogava. Assim, poderíamos estar sempre juntos, sem despertar suspeitas. Afinal, os jogadores estavam o tempo todo um perto do outro.
Assim, nos tornamos cada vez mais próximos e íntimos. Uma vez fizemos algo que durante muito tempo queríamos fazer: transar no chuveiro do vestiário do estádio de futebol. Mas tinha que ser durante um jogo! O medo de sermos descobertos era tanto, que sempre acabávamos adiando a nossa tara. Mas um dia, no intervalo da partida, quando estávamos no corredor que dá acesso ao gramado, cheguei perto dele e o abracei. Uma cena normal, pois sempre fazíamos isso entre os jogadores para desejar boa sorte.
 -Hoje vou fingir uma dor e pedir para ser substituído. Quero que você dê um jeito para sair do campo também.
 -Disse a ele.
 A fisionomia dele se alterou quando falei aquilo, parecendo até que tinha visto um fantasma. Mas ao mesmo tempo, deu um sorriso de canto da boca, bem safado, sinal que já estava imaginando o que poderíamos fazer lá no vestiário.
Coloquei meu plano para funcionar e deu certo, Saí do campo e fui para o vestiário do time. Não demorou muito, ele foi expulso por dar uma entrada mais forte num jogador do outro time.
Eu já estava embaixo do chuveiro quando ele chegou. Parou e ficou me olhando tomar banho. Em pouco tempo, lá estava ele caminhando ao meu encontro, me olhando com tanto desejo que pela primeira vez conseguiu me constranger. Mantive-me firme, esperando ele se aproximar. A excitação aflorava e a vontade de termos um ao outro venceu o medo de sermos descobertos. Foi algo inexplicável, um completando o outro, sem frescuras e esquecendo totalmente que a qualquer momento alguém poderia entrar alguém lá. Mas o jogo era tão importante que ninguém queria perder um lance! Enquanto isso, nós também aproveitávamos ao máximo aquele momento, sem perder nenhum segundo.
Acabamos de nos amar ao mesmo tempo em que a partida de futebol chegava ao fim. Os fogos de artifícios, pareciam estar sendo para comemorar a intensidade do nosso orgasmo.
Voltamos ao chuveiro, terminamos nosso banho e nos trocamos rapidamente. Fingindo que ainda estava doente, me deitei sobre um banco, e o Marcio, no outro canto da sala, sentou-se com as mãos na cabeça, como se estivesse arrependido da entrada forte no adversário. Quase não resisti em dar uma gargalhada e dizer para todos que passamos praticamente os quarenta e cinco minutos transando deliciosamente, mas me contive e tudo acabou bem para todos. Ninguém percebeu nada, pois o nosso time havia vencido e se classificado para a final do campeonato. Então, todos queriam apenas festejar.
Aquele dia foi muito bom, porque tive a comprovação de que o Marcio me amava de verdade. Se ficássemos mais um período juntos, ele também teria feito com que eu o amasse verdadeiramente.
Saímos do estádio juntamente com os outros e fomos para um bar, dando continuidade a comemoração. Depois de algumas horas no bar, nos olhamos com um olhar carregado de desejo. Saímos de fininho e fomos para a minha casa. Nessa época eu já havia resolvido morar sozinho em Cambira, para ter mais privacidade.  Assim, tínhamos um lugar para nossos encontros, sem a preocupação de que alguém poderia ser testemunha do nosso prazer.
O curioso é que nem a namorada dele e nem a minha namorada, desconfiavam do nosso relacionamento. Conseguíamos disfarçar muito bem, ou melhor, enganar os outros. Na verdade, enganávamos nós mesmos.
Eu e o Marcio continuamos juntos por muito tempo, mantendo clandestinamente nossa relação, até que resolvi propor algo a ele. Como minha casa já estava toda equipada, convidei-o para morar comigo, pois queria que a gente se assumisse, ao menos perante os amigos mais próximos.   Ou mesmo sem precisar assumir nada para ninguém. Seríamos apenas dois amigos dividindo a casa, cada um com seu quarto, continuando a manter as aparências.
Estávamos em minha casa. Foi nossa primeira e única briga. Brigamos muito, discutimos até que ele fez um comentário que me machucou muito:
-Você acha que eu sou viado? Sou homem, quero casar e ter filhos, jamais vou morar com outro homem!        Engraçado, ele era o passivo e achava que era melhor do que eu... Achei aquilo tão medíocre, com uma mentalidade interiorana e totalmente desinformada. Aquela atitude dele me decepcionou tanto, que fiquei muito irado. Não acreditava que estava ouvindo tudo aquilo, justamente daquela pessoa que eu sabia que me amava com todas as suas forças. Mas a covardia falou mais alto que o amor que ele pudesse sentir por mim! Ele não teve coragem suficiente para enfrentar as pessoas e os seus próprios medos. Não teve forças para defender a sua vontade de ser feliz. Como pude me enganar tanto? De repente, a delicadeza e o carinho tinham desaparecido de sua personalidade, e eu só conseguia vê-lo novamente como um homem rude e grosseiro.
-Vá embora daqui! Deixe-me em paz.
-Implorei.
-Por sua causa, acreditando no seu amor por mim, recusai um contrato com uma agência famosa de São Paulo, lembra? Só porque você me pediu, pois me disse que não conseguiria viver sem mim. E agora, me decepciona dessa maneira? Suma daqui, e não volte nunca mais.
Quando vi o carro dele se afastando, imediatamente senti um imenso vazio e uma enorme dor no peito. Nem tanto pela partida do Marcio, mas pelo arrependimento de ter deixado de fazer as coisas que gostaria e não fiz, por causa dele, porque havia acreditado em nós dois.
Naquela noite o vazio tomou conta também de minha casa. Andava de um lado para o outro, sem saber o que fazer. Então decidi que o melhor era sair e me divertir, para tentar esquecer aquela pessoa imatura e ingrata.
Tomei banho, troquei de roupa e saí para a rua, sem destino, apenas querendo esquecer tudo aquilo.
Quando abri a porta, encontrei um bilhete do Marcio pregado pelo lado de fora da porta. Ele escreveu que não era merecedor de fazer parte da minha vida, pois não tinha coragem de assumir o amor que sentia por mim, mas que se eu o aceitasse da maneira como estava antes, sem mudar nada, ele voltaria comigo.
Que coisa contraditória! Ele não se achava merecedor de fazer parte de minha vida, mas queria permanecer nela do mesmo jeito.
         Senti uma raiva enorme, e minha vontade era fazê-lo engolir aquele bilhete. Fui caminhando em direção ao centro da cidade, que ficava a poucas quadras de minha casa. Um carro parou ao meu lado e buzinou. Olhei e era o Otávio, um amigo que Marcio odiava, não suportava por achar que ele gostava de mim. Mas é claro que era apenas um amigo.
         -Quer uma carona?
-Me perguntou.
         Naquele momento, senti um desejo incontrolável de vingança, e acabei aceitando a carona.
         Eu e o Otávio éramos amigos de infância, pois nossas famílias eram amigas. Ele era uma pessoa doce e amável. Se havia algo mais, era só na cabeça do Marcio, pois nunca houve nada entre nós, apenas uma grande amizade.
         -Hoje estou a fim de encher a cara, Otávio!
-Disse assim que entrei no carro.
-Quero beber até cair.
         -Está tudo bem?
-Ele me perguntou preocupado.
         -Não, mas tudo pode melhorar, não é mesmo?
-Respondi tentando demonstrar alegria.
         Sugeri que fossemos no barzinho, que na verdade era o único apresentável na cidade. É claro que sabia que encontraria o Marcio por lá ou pelo menos alguém me veria com o Otávio e contaria para ele. Fiquei imaginando a sua reação ao saber que nós fomos beber juntos.
Como eu imaginava, o Marcio estava lá. Entramos e procuramos uma mesa. Ficamos conversando a noite toda, lembrando de nossa infância e de nossas estripulias, o que nos fazia rir muito. Na maioria das vezes, eu fingia que o papo estava interessante e alegre, mesmo não sendo, só para ter um motivo para rir bastante e provocar o Marcio.
Eu ficava observando a reação dele disfarçadamente. Estava saindo tudo como eu havia planejado: sentia que ele estava se remoendo de ódio. Para atiçar mais ainda “a fera”, falei para que o Otávio colocasse a mão em meu rosto, para ver se eu não estava com febre. E ele imediatamente fez este gesto.
Num acesso de fúria, o Marcio bateu o copo que estava em sua mão no balcão, e acabou cortando sua mão. O corte foi profundo e saia muito sangue. Fiquei me sentindo culpado por ter provocado aquela situação. Sem pensar duas vezes, convidei o Otávio para irmos embora e chamei o garçom para pagar a conta. No caminho de casa, ainda pensando em me vingar do Marcio, perguntei ao Otávio:
-Não quer dormir em minha casa, pois já está muito tarde para você voltar para a fazenda. Até porque nós bebemos um pouco além da conta, não é meu amigo?
Ele aceitou e fomos para minha casa. Conversamos mais um pouco e fomos dormir. De manhã, deixei o Otávio dormindo e fui trabalhar.
         Logo que cheguei ao meu setor, recebi o telefonema de Marcio, que gritava do outro lado da linha. Como imaginei que faria, ele passou pela minha casa e viu o carro do Otávio, tirando suas conclusões. Discutimos e deixei bem claro que não queria mais vê-lo, pois o sentimento que eu sentia por ele, havia se transformado em algo que me fazia mal e a ter pensamentos maldosos em relação a ele. Pedi que ele não me procurasse mais.
Duas semanas depois, ele mandou um recado pelo seu sobrinho, dizendo que queria me ver e que, se eu não fosse ele fugiria com a primeira mulher que achasse. Não fui, e ele cumpriu com a promessa, e o pior que nem foi com a namorada dele, pois sabia que ela não aceitaria fugir com ele. Ninguém entendia a atitude dele e nem porque havíamos rompido nossa amizade.
A partir daí, minha vida começou a virar um inferno! Não sei se ele deixou escapar alguma coisa, ou mesmo falou algo dormindo para sua esposa, mas após algum tempo que estavam juntos, sua esposa começou a me provocar. Se eu estivesse parado na rua, como é de costume em cidade pequena, ela jogava o carro em cima de mim. Além disso, me olhava com cara feia ou mandava bilhetinhos me atormentando, com conteúdos que só eu podia entender. Não entendia o motivo de tanta raiva, pois nunca mais eu e o Marcio nos encontramos. Na verdade, nem nos cumprimentávamos mais.
Não tinha mais interesse em sair com ele. Além disso, não acho certo sair com homens casados. Não vou negar que ainda gostava dele, mas não o procurava. Doía muito saber que estava com aquela mulher, aliás, doía até quando ele passava por mim sozinho. Lembranças, não conseguimos apagar de um dia para o outro...
Sempre fiquei na minha e tenho a consciência limpa de nunca ter feito nada para provocá-lo. Mas a esposa dele não parava com as provocações, me perseguindo e tirando a minha paz. Para qualquer lugar que eu fosse convidado, ficava imaginando se eles iriam também. Não suportava mais ver “aquela senhora”, que além de feia era totalmente brega. Todas as coisas que ela estava me fazendo me despertaram um desejo de me vingar.
No carnaval, eu estava fazendo trabalho voluntário para uma entidade filantrópica numa das noites do baile. Fiquei trabalhando no caixa, vendendo fichas para bebidas. Num determinado momento, estava me sentindo observado, e para minha surpresa, era o Marcio. Ele ficava me olhando do outro lado da pista de dança, com insistência, e ela também, só que com um olhar de deboche e cinismo. Enquanto ele olhava com olhar de desejo, ela “me fuzilava com o olhar”, com vontade de me matar. Acredito que ele estava meio bêbado e a saudade de que sentia de mim fazia com que ele se descontrolasse. Surgiu em mim uma mistura de desejo pelo Marcio e de vingança contra sua esposa. Queria mostrar a ela que o verdadeiro amor dele era por mim, e acabei passando por cima de uma de minhas normas de conduta: nunca ficar com nenhum homem casado. Ainda mais com ele! Aquela mulher não deveria ter me provocado tanto, pois perdi a razão e deixei a minha emoção caminhar solta, sem restrição alguma.
Aproveitei quando ele foi ao caixa comprar fichas de bebida e falei:
-Se você quiser, podemos nos ver ainda nesta noite. É só dar um jeito na sua mulher.
Não precisou muito tempo, e eles tiveram uma briga. Ele a levou embora e retornou. Deu uma volta pelo salão, para me mostrar que estava sozinho, e saiu. Saí logo em seguida, e fomos para a minha casa. Transamos até o dia amanhecer. Caprichei no sexo, fazendo com que ele ficasse transtornado de tanto prazer. Fiz questão de deixá-lo todo marcado nas costas e nádegas, para que sua esposa pudesse ter certeza que ele esteve comigo. Era minha vingança.
Logo que ele foi embora, para completar minha vingança contra aquela mulher odiosa, fui até o seu local de trabalho. Quando a encontrei, fui logo falando:
-Se você continuar me provocando e não parar de falar mal de mim, vou continuar saindo com seu marido. E pelo prazer que ele sentiu durante a noite toda, acredito que ele vai preferir ficar comigo, te deixando sozinha.
Saí dali sem olhar para trás, com a certeza de que tudo o que falei mexeu muito com a cabeça dela ou que no mínimo serviu para que ela preponderasse à situação, tomando a decisão mais acertada.
Depois desse dia, nunca mais saí com o Marcio. Mas a cada vez que nos encontrávamos em algum lugar, percebia que ele sempre me olhava de canto de olho. Eu tenho certeza que fui muito importante na vida dele e é claro que ele também teve a sua importância na minha. Mas tudo não passava dos olhares. Não existia mais nenhuma possibilidade de ficarmos juntos. Os sentimentos ficaram guardados no passado e lá devem ficar! Apenas recordo os momentos felizes e infelizes que essa relação me proporcionou.
A esposa dele parou de me perseguir e tudo voltou ao normal. Cada um seguiu o seu caminho e muito raramente nos encontrávamos na cidade, e quando isso acontecia, fingíamos que não nos conhecer. Triste acabar tudo assim, pois era uma história que tinha tudo para ser única e verdadeira.
Sabe aqueles rompantes que temos de querer mostrar aos outros que somos melhores que eles? Depois que tudo passa, percebemos que estávamos apenas nos magoando ainda mais.
E tudo voltou a ser de certa forma normal, cada um seguiu o seu caminho e muito raramente a gente se encontrava e quando isso acontecia, fingíamos que não nos conhecíamos. Triste acabar assim, uma história que tinha tudo para ser única e verdadeira.



















CAPÍTULO 15






       Voltei a ser convidado para muitos eventos e a fazer comerciais de TV. A Titu´s Jeans retornou com os seus desfiles, e eu desfilava por muitas cidades, em todas onde a fábrica tinha revendedores da grife. Graças a Deus as coisas estavam melhorando de novo para mim.
 Em um desses eventos, na cidade de Cascavel, aconteceu uma coisa muito engraçada. Havia uma espécie de regra: assim que terminasse um desfile, voltávamos todos ao hotel, e ninguém permanecia no evento. Mas naquele dia, fizemos o desfile dentro de uma Boate, e logo que terminou, eu e uma das modelos, a Mel, fomos convidados pelo proprietário para ficarmos por mais um tempo no local. Na verdade, como as pessoas tinham gostado muito de nossa apresentação, ele queria que realizássemos um show a parte. Apesar de ser um convite um tanto quanto estranho, acabamos topando, mas sem comunicar o coordenador da equipe dos modelos. O cachê que ele nos propôs era quase três vezes o cachê do desfile. Como neste evento não estavam nem a Fernanda e nem o Robert, foi mais fácil enganar a equipe que estava lá conosco. Fomos até o Hotel e um motorista, enviado pelo proprietário da Boate, ficou nos esperando.
Eu e a Mel chegamos vestidos ao palco, mas tiraríamos uma peça de roupa a cada vez que a luz se apagasse, até ficarmos completamente nus. Era uma apresentação sensual, sem ser vulgar. Mudávamos de posição, escondendo nossas partes íntimas. Apenas nosso bumbum ficava à mostra, pois nos abraçávamos, um de frente para o outro. Mas as pessoas que ficavam atrás do palco conseguiam nos ver frontalmente.
Após a apresentação, nos vestimos, recebemos o cachê e voltamos ao hotel. Achamos que ninguém da equipe iria saber o que fizemos, mas nos enganamos. Na manhã seguinte, já estava estampada, na primeira página do único jornal da cidade, a foto onde eu e a Mel estávamos abraçados, nus.
O coordenador ficou muito bravo, e nos chamou para nos dar um “esporro” daqueles! Só não nos chamou de anjos, porque o resto do vocabulário todo foi dito. O pior é que em frente a todos os outros modelos.
         Ligou para o Robert dali mesmo, com todos ouvindo a conversa.
         - Agora estamos ferrados!
-Cochichei baixinho no ouvido da Mel.
         O Robert deve ter perguntado ao coordenador o que estava escrito no jornal, pois ele leu a manchete: “Casal de modelos exclusivos da Titu´s Jeans fica nu em apresentação na boate.”
 Ele falava alto e aos poucos foi baixando o tom da voz, até seu semblante ficar mais suave. Eu e Mel ficamos atentos, mas sem entender nada.
Quando desligou o telefone, nos disse:
-Você tem mesmo muita sorte, pois o Robert gostou da idéia maluca que tiveram e, se vocês toparem, iremos incluir esta performance nos desfiles que faremos daqui para frente.
Os outros modelos ficaram muito bravos, pois sem querer, acabamos agradando o patrão. O Robert tinha adorado a propaganda que fizemos para a sua marca. Ele realmente era muito louco, do tipo de homem que qualquer paixão o divertia. Acabamos transformando uma atitude impensada em algo chamativo para a empresa.
Mas não topamos fazer a mesma apresentação. A equipe foi reunida e fomos direto para a outra cidade, onde teríamos mais um desfile para fazer. O grupo teria que mudar toda a marcação do desfile, pois eu e Mel, a partir dessa data, abriríamos o desfile com uma apresentação, que tivemos que criar durante a viagem. Estávamos indo para uma cidade vizinha de Cascavel, e por causa da manchete do jornal, todos queriam ver os famosos modelos que haviam ficado nus na boate.
E assim foi durante algum tempo. A cada desfile, nossa apresentação tornava-se mais aprimorada. Evidentemente, eu e a Mel, passamos a ganhar mais do que o restante do grupo de modelos, fazendo com que muitos deles nos odiassem. A atenção do público ficava voltada apenas para nós dois e isso fez com que fôssemos deixados de lado pelo grupo, por causa do ciúme que sentiam. Isso acabou tornando a amizade entre eu e a Mel muito forte e também fez com que a Fernanda trocasse todo o grupo de modelos.
Acabamos formando um grupo mais homogêneo na nova equipe de modelos. Três deles transformaram-se em grandes amigos meus: Paulinha, Joana e Flávio. A Paulinha era uma menina, que apesar de não ter a altura de uma modelo, conquistava a todos com seu carinho e meiguice. Os seus longos cabelos negros e cacheados eram o seu orgulho, e realmente, eram lindíssimos.
Tornamos-nos amigos de cara, mas acabou também chamando a atenção do filho da Fernanda, que se apaixonou de imediato. No início, é claro, ele fazia de conta que não estava apaixonado. Na verdade, os dois sentiram a mesma coisa, mas aos poucos foram deixando fluir esse sentimento e acabaram se casando. São casados até hoje! Mas não foi por esse motivo que Paulinha permanecia no grupo e sim, pela sua competência profissional.
Joana era a outra modelo, com quem também criei um forte laço de amizade, que dura até hoje. Ao contrário de Paulinha, ela era bem alta, e também tinha um carisma enorme. Era muito linda, e continua assim.         E também havia o Flávio, um lindo jovem moreno, com um corpo perfeito, mas não era muito carismático. Mas para que carisma se tinha toda aquela beleza?
A contratação do Flávio foi um tanto engraçada. A Fernanda me ligou dizendo que faltava um modelo masculino para fechar o grupo. Como estava acontecendo à formatura de Manequins, me convidou para irmos até lá, e quem sabe conseguiríamos escolher um rapaz para compor o grupo. Vimos todas as apresentações e percebi que a Fernanda ficou entre o Flávio e outro modelo loiro. Fiquei apreensivo, pois loiro já bastava eu! Mas permaneci em silêncio, pois não queria dar a minha opinião. De repente, ela me olhou firmemente e bem séria, disse:
-Se você tivesse que escolher quem escolheria?                 Imediatamente escolhi o Flávio.
          -Sei... Você não quer é concorrência, pois o carinha loiro é perigoso!
 -Ela disse dando uma gargalhada.
         -O Flávio não tem carisma, mas ele é muito mais bonito do que o outro. Sem contar que é melhor as pessoas visualizarem a roupa usada por um moreno e um loiro. - disse eu, tentando disfarçar que ela estava certa.
         Ela concordou e fomos falar com o Flávio.  Claro que ele aceitou imediatamente e assim formamos o novo grupo de modelos da Titu´s Jeans.         
Algum tempo depois, o Flávio e a Joana começaram a namorar se casaram e estão juntos até hoje, formando uma linda família.
Com um novo grupo formado, nessa nova fase de desfiles, contávamos com um ônibus totalmente modificado. Assim os modelos viajavam com muito conforto. Era quase um trailer, e na parte superior do ônibus, havia uma passarela onde fazíamos os desfiles, sempre ao ar livre. Ele era fantástico, todo preto. Quando nós chegávamos à cidade em que seria realizado o desfile, era total agito.
Lembro de uma viagem em que eu e a Paulinha decidimos pregar uma peça, uma brincadeira com os outros modelos. Eu sabia ler “a sorte” nas cartas e ela fazia a parte de divulgação.
         Comecei a ler as cartas, e é claro que a minha primeira “cliente”, foi a Paulinha. Ela procurava chamar a atenção dos outros dizendo:
         -Nossa você é muito bom nisso! Acertou tudo. Nosso plano deu certo, e os outros também queriam que eu lesse a sorte deles. Nunca me diverti tanto! Falava qualquer coisa, tentando adivinhar o que eles gostariam de ouvir. Como eu sempre fui muito observador, foi fácil fazer com que eles acreditassem em mim. Quando terminei a sessão de cartomancia, olhei para Paulinha e disse que estava cansado daquela brincadeira, os modelos simplesmente me olharam e não acreditavam que tudo aquilo era mentira.
         Fui para o fundo do ônibus onde tinha uma cama de casal e todos foram atrás de mim. E começaram a me bater, claro que coisa de amigos, sem violência. Como a Paulinha era um “mignonzinho” e delicada, não fizeram nada contra ela e descarregaram tudo em mim. Foi muito legal saber que tinha grande potencial em fazer as pessoas acreditarem em tudo o que eu dizia.
Durante todo o tempo em que fiz parte desse grupo, vivia em outro mundo. Não lembrava das minhas tristezas, decepções e frustrações e muito menos da minha vida sofrida com meu pai. Existia não somente um grupo de modelos, mas um grupo de amigos, que se gostavam e se respeitavam, algo tão forte que persiste até hoje. 
Saíamos sempre juntos, fazíamos festas um na casa do outro, e é claro, também freqüentávamos a casa da Fernanda e do Robert. Eram festas fantásticas e inesquecíveis. Inexplicável!
Durante muito tempo nosso grupo se apresentava em eventos, e a cada nova apresentação, nos saíamos melhor que nas outras. Este é um trabalho que todas as pessoas gostariam de ter: trabalho e diversão, uma união perfeita. 
Mas como na vida nada dura para sempre, os desfiles começaram a não despertar mais a atenção das pessoas, e a empresa que nos patrocinava descobriu que com maneiras mais fáceis, produtivas e menor custo poderia atingir seu público. A equipe se desfez e cada um seguiu o seu caminho. Paulinha foi à única que permaneceu na empresa, mas não mais como modelo e sim em outro setor.







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